domingo, 19 de janeiro de 2014

A MUDA



Certa vez, com muita sapiência, disse-me o poeta, compositor, jornalista e parceiro de tantas canções, Abel Carvalho: "A poesia não é para quem faz, a poesia é para quem lê". Baseado nesse jargão é que resolvi homenagear uma figura que fez parte da vida dessa cidade e que é tão importante quanto as mais importantes autoridades e até mais do que muitas que estão em “evidência”.  Esse poema, é a história de milhares de bacabalenses.

A MUDA

Violo o cofre do desejo
Vasculho o bolso do prazer
E afano as moedas opacas do acaso
E compro com elas um corpo
Para minha iniciação sexual.

Quem é essa puta
Essa rapariga, esta prostituta
Que não fala, não escuta
E abala as  minhas  estruturas
E  de outros meninos também
Com centavos, com vintém?

Sua casa de taipa,
Coberta de palha, chão batido
Era freqüentada diariamente
Pelos moleques tarados
A procura do primeiro orgasmo.

Em uma grande fila
Pretos, brancos, pobres, ricos, limpos, sujos
Vindos dos quatro cantos de Bacabal,
Com seus bolsos pesados
Pelas moedas da libido,
No afã de penetrar aquela vagina surrada.

Entra um ansioso,
Sai outro feliz
Uma alegria só,
Carne, corpo, sexo
Uma trepada infantil
N’uma cama de colchão de palha
Ao lado, uma bacia e vários litros d’água
Para a higiene coletiva.

Esta mulher era a “Muda”
A puta da criançada
Morava no Mufumbo, cabaré da pesada
Foi com ela o meu primeiro orgasmo.
Perguntei sorridente,
Mas como era muda e surda
Não ouviu para responder
Se foi bom para ela
Como foi bom pra mim.

Zé Lopes

Do livro “Bacabal Alves de Abreu Souza Silva de Mendonça e da Infância Perdida”


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