O ex-presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da
Silva "não é um corrupto" e viveu o escândalo do "mensalão"
com "angústia e alguma culpa", revelou o ex-presidente do Uruguai,
José Mujica, na biografia autorizada "Una oveja negra al poder" (Uma
ovelha negra no poder, em tradução livre).
Trechos do livro dos jornalistas uruguaios Andrés
Danza e Ernesto Tulbovitz, publicado recentemente na Argentina, e que será
apresentado nesta sexta-feira em Montevidéu, foram divulgados pela imprensa.
De acordo com a biografia, Lula teria contado a
Mujica no início de 2010, numa reunião em Brasília, que tinha que "lidar
com muitas coisas imorais, chantagens" e que "esta era a única
maneira de governar o Brasil".
Lula sempre negou ter qualquer informação sobre o
escândalo que comprometeu grande parte da estrutura política do Partido dos
Trabalhadores e do aparato governamental.
Em 2005, quando os detalhes do esquema de
pagamentos mensais para comprar apoio político começaram a aparecer na
imprensa, um indignado Lula disse se sentir traído pelas práticas inaceitáveis
das quais não tinha conhecimento.
"Lula não é corrupto como foi (o ex-presidente
Fernando) Collor de Mello e outros presidentes brasileiros", refletiu
Mujica, de acordo com a biografia.
A AFP tentou sem sucesso entrar em contato com
Mujica.
Andrés Danza, um dos autores, afirmou à AFP que boa
parte do livro se debruça em reflexões sobre o Brasil. "Mujica vê Dilma
(Rousseff) e Lula como uma espécie de padrinhos, os dois lhe ajudaram muito.
Sobre Dilma diz que sempre esteve a serviço do Uruguai, que é mais executiva do
que Lula, mas que tem menos carisma".
A biografia também traz comentários sobre o
ex-presidente da Venezuela, Hugo Chávez, que teria revelado a Mujica que
durante um desentendimento com a Colômbia o presidente russo, Vladimir Putin,
aconselhou-o militarmente para um eventual confronto com o país vizinho.
E ainda fala sobre o apoio da presidente da
Argentina, Cristina Fernández de Kirchner, a Mujica durante as eleições de
2009.
Nas linhas do livro, também abundam críticas a
membros do seu partido, ao Poder Judiciário, a organizações sociais e grupos
feministas, e mesmo ao ex-vice-presidente Danilo Astori, que é descrito por
Mujica como um homem sem carisma e "sex appeal".
O ex-presente admitiu aos jornalistas outras
curiosidades como, sendo presidente, andava armado quando saia sozinho.
"Podem me limpar, mas com certeza levo algum junto", disse Mujica.
Os autores observam que Mujica teria informações de
um suposto complô para derrubá-lo desde os primeiros anos de sua administração,
e que, "para evitar um golpe de Estado, depôs ministros e líderes de todos
os escalões, promoveu leis controversas, assumiu o protagonismo em conflitos
internacionais, recebeu refugiados sírios, aceitou abrigar ex-prisioneiros de
Guantánamo (...) tudo feitos para não deixar nenhuma dúvida de quem era o
presidente".
Danza comentou que depois de ler a biografia,
Mujica disse que concordava com algumas coisas e discordava de outras.
"Ele provavelmente não queria que algumas coisas fossem escritas. Uma
coisa sobre ele é que ele é verdadeiro, fala o que pensa, e isso às vezes trabalha
a favor e outras contra".
LÍDER DO DEM
CONVIDARÁ MUJICA PARA FALAR SOBRE CONFISSÃO DE LULA
O
pedido será apresentado na Comissão de Relações Exteriores da Casa e tem como
base um livro-reportagem sobre Mujica em que Lula teria narrado ao
ex-presidente uruguaio, em encontro em 2010, que esse esquema de corrupção
"era a única forma de governar o Brasil".
"A
acusação é muito séria, até porque é a própria esquerda brasileira que trata
Mujica como uma espécie de mártir e coloca sua índole acima de qualquer
suspeita. Se ele diz que o ex-presidente Lula, não só confirmou ter
conhecimento sobre o mensalão, como admitiu que era a sua única forma de
governar o País, isso coloca em xeque toda a tese que o inocentou do esquema",
defende Caiado, em nota divulgada. O caso foi publicado em reportagem do jornal
O Globo desta sexta-feira.
Segundo
o líder do DEM, o convite também será feito ao ex-vice presidente do país
Danilo Astori, que, segundo Mujica, estava na sala e também ouviu a confissão
do petista.
O
ex-presidente Lula sempre negou que soubesse da existência do mensalão. No auge
do escândalo, Lula chegou a gravar um pronunciamento em que afirmou que se
sentia traído e pedindo desculpas. Posteriormente, contudo, ele passou a
rejeitar a existência do esquema de corrupção, mesmo após condenações de
pessoas próximas a ele pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
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