A PAIXÃO DO MEU AMIGO E O MEDO DA MINHA PAIXÃO
O namoro é uma instituição de relacionamento interpessoal não moderna, que tem como função a concretização do sentimental entre duas pessoas em troca de conhecimentos e uma vivência com um grau de comprometimento menos sério que o matrimônio. A grande maioria das pessoas utiliza o namoro como pré-condição para o estabelecimento de um noivado ou casamento. Eu sempre entendi que é muito mais fácil uma mulher arranjar um namorado do que o homem arranjar uma namorada. A mulher escolhe, o homem é escolhido. Outra coisa, namoro é bicho fácil de terminar. Em 1983, ainda um novato na polícia civil, a primeira delegacia que trabalhei foi no bairro da Vila Palmeira. Nessa época, os meus melhores amigos eram os comissários de polícia Hailton Barbosa Costa, Marcos Valério e Henrique. Hailton namorava com uma moça muito bonita conhecida pelo nome de Regina. O Henrique namorava a irmã de Regina, uma tão bonita quanto a outra. A namorada de Henrique era Tércia. Nós três éramos como carne e unha, onde um estava, os outros estavam também. Hailton era poeta e tinha uma paixão avassaladora pela bela namorada. Em alguns plantões, ele varava a noite chorando devido aos desentendimentos com a bela moça. Porém, entre uma lágrima e outra, ele escrevia belos poemas bem metrificados e rimados para a namorada. Eu, apesar de na época lamentar pelo seu sofrimento, por outro lado, achava a coisa mais linda a paixão dele por ela. Para mim, era uma novela da vida real. Ele escrevia à noite, mas no amanhecer do dia, rasgava várias poesias que escrevia e me pedia para eu ler em voz alta aquelas que ele entendia ser as melhores. Certo dia, Hailton me disse: meu caro amigo Erivelton, a distinção entre a paixão e a loucura é muito perigosa e incerta, pois não existe uma linha divisória entre as duas. Nessa época, eu era metido a cantor, tinha um violão e tocava medianamente. Então, eu musicava os poemas de Hailton e depois cantava para o deleite do amigo apaixonado. Certo dia, resolvemos criar uma banda chamada “Banda HEH”. Ensaiamos duas das nossas músicas para o lançamento da banda no aniversário de uma das lindas irmãs. Todavia, a música forte da banda era o sucesso de Gilberto Gil, “Andar Com Fé”, de 1982, do álbum Um Banda Um, o mesmo que trouxe clássicos como “Drão” e “Esotérico”. Chegou o dia do aniversário, a banda estava lá. Eu era o crooner e o violonista da banda; Henrique era o baterista e Hailton revesava nas mãos um triângulo e um pandeiro. Eu sentia que faltava alguma coisa na nossa banda, mas a animação do trio não permitia muitas reflexões sobre os detalhes de uma banda musical. Tocamos a primeira música da nossa autoria, mas não conseguimos animar nem a aniversariante nem os convidados. Cantei mais uma música e nada de aplausos. Pensei: tem alguma coisa errada. Então veio o grande momento: a música “Andar Com Fé”. Terminei de cantar Gilberto Gil e uma moça que estava sentada numa mesa ao lado da banda bateu palmas. Somente ela bateu palmas. Era Rosa Austríaco, muito amiga da aniversariante e da sua irmã. Logo em seguida, Hailton chegou no meu ouvido e disse: Eita porra, ninguém tá gostando da nossa banda. As meninas querem ligar a radiola. Ouvi o cochicho já meio decepcionado com o nosso desempenho. Então, sugeri: Liguem a radiola. Imediatamente ligaram o som e começou a rolar as músicas: “Muito estranho”, de Dalto; “Leão ferido”, de Biafra; “Morena Tropicana”, de Alceu Valença; “Banho de Espuma”, de Rita Lee e “Festa do Interior”, de Gal Costa. Nesse momento, nós mesmos sentimos que a festa melhorou. Pois bem, essa foi a primeira e última apresentação da “Banda HEH”. Fiquei por ali meio desanimado e terminei me aproximando de Rosa, a única moça que nos aplaudiu. Daí começamos um namoro aprovado com louvor pelos meus colegas. Era uma menina muito bonita, cabelos pretos, longos e educadíssima. Todos aprovaram o namoro. Acontece, porém, que Rosa tinha uma outra paixão desde quando ela tinha 13 anos de idade. O nome do cara era Manezinho. Dizia ela: olha, eu quero namorar com você, mas gosto muito de ouvir o Cantor Roberto Carlos, pois as suas músicas me fazem lembrar o Manezinho. Não gostei da prosa, mas enfrentei a parada. Logo, naquele período, foi anunciada a vinda do Rei à nossa capital. Rosa falou que gostaria de ir ao show. Então pensei: Puxa vida, ela continua pensando no Manezinho. Falei com meus botões, com meus amigos e decidi: vou terminar esse namoro. Avisei meus amigos que não iria mais fazer parte do grupo dos 3 casais, pois havia terminado com Rosa. Falei que era culpa de Manezinho e Roberto Carlos. Acabou o namoro, acabou a banda e passei uns tempos chateado com Roberto Carlos e Manezinho. Anos depois, me encontrei com Rosa num shopping, eu já casado com a bela Iva e ela casada com um rapaz muito elegante. Então perguntei para ela: Rosa Austríaco, cadê Manezinho? Ela respondeu: que Manezinho?
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