BENDITAS QUITANDAS
... benditas são as quitandas, que despertam as minhas lembranças
e, teimosas, ainda teimam firmes e sisudas, a atender "a compra a retalho", para quem não se desapega da pressa, do hoje tão corrido
e, dentre tantas, trago a de Dominguinho Diniz, onde ia em busca do sagrado cravinho para o doce de banana ou de casca de laranjas, a exalar e a invadir os meus famintos desejos e a mitigar a minha deliciosa fome. Mas, ali, também, habitava o meu terror. Os botões, as linhas e os ri ris, que iriam ser usados na urgente costura. Só que mamãe tinha o olhar absoluto. E a parte chata, também, acontecia. Fazer a troca. A vergonha era imensa
e, no auge "da pelada", no fim de tarde, cumpria a minha sina, tal um ritual diário. Ia à de Domingo Tabuleiro, o Cheiroso, comprar a folha de fumo, para a brejeira da vovó. Ainda que contrariado, voltava alegre. A dona Juscelina, "aparentada" da vovó, sempre me presenteava com "umas doces balinhas". Não que eu iria "apagar" alguém! "Cruzincredol!" Só ia alimentar "as lombrigas"
e, de olho comprido, passava à porta da de Noratinho, "doido pra ixpermentá o arco da roleta, da caipira". No entanto, criança era terminantemente proibido, jogar. Ficava "só quereno"
e, nas compras de todo instante, corria à de "seu" Chiquinho Oliveira, à cata de um quilo, de uma quarta e de uma medida. E, seguramente, trazia açúcar, café e vinagre e, "de quebra", mais umas tantas miudezas
e, pela andanças profissionais de papai, desfrutei de bons papos e muita histórias na de Zé Abacachê, em São Bento
e, a curiosidade de conhecer o feitiço do conhaque, residia na de "seu" João Ubaldo, onde Sóstenes, tresvariava com sua invocação por Marinalva, em um discurso quase inaudível, e Basileu metia medo, com a promessa de comer criancinha. Aí, só restava observá-los, de longe, em "seus marmanhares" de mais uma dose, em um favor cruel e impagável, beirando ao degradante
e, para minha alegria, aqui, "na capita", fui frequentador assíduo da de Zé Iscangalhado, sempre atendido pelo "meio gol" Abdias, "o Abedê", a desfrutar "um torpedo", que passou a ser denominado "quebra queixo". Era pura glicerina. E, para os curiosos, vai a receita. Um dedo de São João da Barra, um de dedo de pinga, um dedo de Caldezano e "um chorinho de cerva". Aí, era torcer pra meu santinho Santo Onofre segurar as pernas ou explodir a cabeça, na ressaca do dia seguinte ...
Zé Carlos Gonçalves


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