domingo, 7 de abril de 2019

BACABAL CULTURA.SEM - POESIA - INFÂNCIA VIOLADA


INFÂCIA VIOLADA  
 


Sobra, vaza por entre os dedos

E escorre como velas queimando

O resto que sobrou

Daquela criança que pulava muros,

Que furava cercas

E corria nos quintais,

Roubava frutas,

Garrafas vazias

E vendia, para com o dinheiro,

Comprar a bola “dente de leite”

Para a pelada das tardinhas.

 

Cai no chão,

Em gotas derretidas

Retalhos daquela criança

Que fabricava

Seus próprios brinquedos,

Seus carrinhos,

Seus aviões, seus barcos,

Seus tanques de guerra, seus trens,

Todos de lata.

Criança que fazia suas pipas

Seus papagaios, suas gaiolas,

Seus piões, seus castelos de sonhos,

Seus moinhos de ventos,

Seus cata-ventos de esperanças.

 

Que pão matou sua fome?

Que água matou sua sede?

Que açúcar adoçou?

Que sal salgou?

Que palavra pronunciada

Disse daquela criança

Que sentiu frio e não teve cobertor,

Que sentiu cansaço e sono

E não teve pouso

Quem te salvou do afogamento?

Da bala perdida?

Da faca afiada do menino mau?

Da pedra certeira?

Da rasteira fatal?

Do cascudo doído?

Da surra animal?

Do castigo bruto?

Quem te estendeu a mão, afinal?


Anda agora este homem,

Grisalho, abatido,

Míope, envelhecido,

Cheio de manhas e tiques

E em tudo que faz,

Deixa ao relento

O rastro dos chinelos de couro

Que pisaram o chão

De uma infância

Plantada no jardim

De uma lembrança muda.
 
 
Do livro - Bacabal Alves de Abreu Souza Silva de Mendonça e da Infância  Perdida
 
 

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