"Desde que a Força Nacional chegou a gente vem sendo
agredido. Eles estão atirando na gente direto com bala de borracha. Tratam a
gente feito animais." O relato foi feito ao Estado por um preso, de dentro
do Complexo de Pedrinhas, em São Luís, o epicentro da crise penitenciária no
Estado e cenário de mortes de 62 detentos desde o ano passado. O Ministério da
Justiça vai investigar a denúncia.
Por celular, de dentro da cela, o rapaz, que está no complexo há
três anos e meio, relatou violência sistemática por parte da tropa federal.
"Mais de 20 pessoas já foram baleadas", diz. "Vieram só para
maltratar."
A Força Nacional chegou ao presídio em outubro, após uma rebelião
que terminou com 18 mortes. Nesta semana, o governo do Estado renovou o
convênio com o Ministério da Justiça para que as tropas fiquem em Pedrinhas
mais dois meses.
O detento foi contatado por meio da mãe dele, que estava do lado
de fora do presídio. Junto com outros parentes de presos, ela temia pelo uso de
armas não letais dentro da unidade, como bombas de gás e balas de borracha.
"Na quarta-feira, eram 13h quando ouvi as bombas aí dentro. Eles vão
acabar matando alguém lá", disse a mulher.
As principais agressões, segundo o rapaz, partem de um major da
Força Nacional. "Ele quebrou um cara, o cara estava com a boca inchada.
Isso está errado", disse. Ele não soube informar, porém, o nome do oficial
que praticaria as agressões.
Após passar pelas sete unidades masculinas do complexo, o rapaz
afirma que a pior situação acontece no Centro de Detenção Provisória (CDP).
"Lá eles botam 28 num xadrez só. É para ficar oito pessoas só", diz.
Ele afirma que um pavilhão onde caberiam cem pessoas chega a abrigar mais de
300.
Na hora de dormir, diz o preso, muitas vezes é preciso revezar por
falta de espaço no chão. "Tem gente dormindo no chão do banheiro, fica com
as costas cheias de marca, com aqueles bichinhos, sabe como é que é cadeia,
né?"
Mortes. Cercado de companheiros de
cela, ele desconversa quando questionado sobre a guerra travada pelas facções
Bonde dos 40 e Primeiro Comando do Maranhão (PCM). "Morte sempre
aconteceu. Deixa isso quieto."
O preso relata um cotidiano sem higiene nem comida decente. "A
carne vem fedendo demais, não presta. Só presta o que nossa família prepara,
que está trazendo com muito amor e carinho." No entanto, ele diz que
várias vezes as famílias são proibidas de entrar e os presidiários acabam
ficando sem comida. Outro problema relatado por ele é a falta de atendimento
médico. "Nem todos os presos recebem atendimento. Porque eles colocam na
consulta médica e, na hora da consulta, eles não tiram a gente (da prisão). É a
maior dificuldade para atender as pessoas."
Investigação. Questionado sobre as
denúncias do detento, o Ministério da Justiça afirmou que "o Comando-Geral
da Força Nacional determinou a abertura de Processo de Avaliação de Conduta, a
fim de apurar os fatos descritos".
"As equipes da Força Nacional atuam em apoio à polícia local
e sempre são orientadas a utilizar apenas a força necessária, até mesmo em
situações que necessitem intervenção em unidades penitenciárias", afirma a
nota do órgão.
O ministério afirma que a Força Nacional definiu como principais
objetivos evitar conflitos entre os internos e ajudar na manutenção da ordem.
Segundo o governo federal, as tropas recolheram, em parceria com a Polícia
Militar do Maranhão, dezenas de armas artesanais no interior do Presídio de
Pedrinhas.
Choque. A Tropa de Choque da PM
também está no complexo. Segundo o comandante do órgão, Raimundo Nonato Sá, o
objetivo da permanência da tropa é criar um clima de quartel dentro da unidade.
Entre as medidas adotadas, estão revistas às celas até três vezes por dia.
Contatada sobre as queixas dos presos, a Secretaria de Estado da
Justiça e da Administração Penitenciária afirma que todos os casos de
maus-tratos são apurados pela Corregedoria e que os detentos são atendidos por
assistentes sociais.
O Estado já havia mostrado a preocupação dos familiares a respeito
da situação tensa e da superlotação nas unidades. A reportagem entrou no
Presídio São Luís 1, parte do complexo, onde há a pressão das facções sobre os
funcionários e outros presos.
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