domingo, 29 de janeiro de 2023

COLUNA DO DR. ERIVELTON LAGO

 


O POETA E O CAXEIRO VIAJANTE

O poeta Maurício Ortegal, um jovem de 31 anos, namorou três anos com Maria Marta. Antes de completar quatro anos, o namoro terminou. Ela era uma moça muito bonita, inteligente e professora da única escola da comunidade do povoado de Catucá, nos arredores da cidade. O seu pai era o pequeno fazendeiro Zé Agripino. O namoro entre Marta e Hortegal caminhava muito bem. Ele era apicultor e obtinha cerca de sete mil reais por mês na área de criação e tratamento de abelhas. Dessa forma, trabalhava com extração e confecção de produtos provenientes de abelhas, tais como mel, própolis, geleia, dentre outros produtos. Apesar dessa profissão, o seu forte era a poesia. Na verdade, ele era o poeta da região e reconhecido pela sua capacidade de falar, escrever e recitar. No final da primavera de 1975, chegou no povoado o caxeiro viajante Joaquim Nazareno. Moço de 28 anos de idade que transitava montado num belo cavalo selado com uma sela americana comandando uma tropa de cinco burros fortes. Ele vendia perfume, remédio “pra tudo”, roupas íntimas, chapéus, material completo de manicure e outras bugigangas. Ele chegou no povoado Catucá, montou uma pequena tenda e contratou uma ajudante por dois dias, sábado e domingo, geralmente, ele fazia uma entrevista de dez minutos e escolhia a moça mais bonita e com assertividade profissional: aquela moça que tinha postura comportamental positiva diante das pessoas e das situações cotidianas. Maria Marta foi a moça escolhida. Nessa época as essências mais procuradas eram: o Lancaster, alfazema, Chanel, água de colônia, Styletto, do Boticário, Rastro, Opium, Toque de Amor, da Avon, Tarot, da Natura, Giovanna Baby e o Ma Griffe, da Carven. O ambulante tinha tudo isso. Na verdade, ele tinha uma verdadeira miscelânea. Naquele sábado o povo da redondeza foi em peso para o povoado. O ambulante animava a feira com o som do seu gravador e toca-fitas Phillips que tocava Menina de Cabelos Longos, Nuvem passageira, Azul da Cor do Mar, foi um Rio que passou em Minha Vida e moça, do cantor Vando. O homem era um misto de mpb e brega chique. Por volta das onze horas da manhã, o poeta Ortegal chegou no local. Porém, quando viu a sua amada animadamente feliz vendendo ao lado do ambulante, o seu coração tremeu. Como se espera de qualquer moço apaixonado, ele se aproximou e perguntou para Marta: você está trocando mel por perfume? Respondeu Marta: nem mel e nem perfume, apenas me divirto sem que isso possa causar algum ciúme. Joaquim, se aproximou e perguntou: quem é o moço? Respondeu Marta: te apresento o meu namorado Ortegal. Bom dia, Ortegal, onde você encontrou tanta sorte em ter como namorada uma moça tão bela? Respondeu Ortegal: joguei fora os pés de coelho, o trevo de quatro folhas e as fitas do senhor do bom fim, aí Marta apareceu para mim. Respondeu Joaquim: então você jogou a sorte fora, quem sabe possa eu encontrá-la por aí. Ortegal pressentiu algo ruim, pois Marta, ao invés de olhar para ele, fitava, sem piscar, o elóquio de Joaquim. Na mesma noite Ortegal foi à casa da amada, mas percebeu a sua frieza fúnebre, ela estava completamente diferente. Em três minutos de conversa ele falou, apenas para testar: você está apaixonada pelo ambulante, então tudo acabado entre nós, já não há mais nada! Tudo acabado entre nós antes da madrugada, eu parto e você fica, se eu volto outra vez, não sei. Ela respondeu: eu gosto de você, mas estou confusa, nosso momento está à meia luz, não exclua agora o que pode ser depois, nosso orgulho e o nosso egoísmo pode nos separar. Respondeu Ortegal: vi como você olhava para o ambulante. A música do seu toca-fitas e o Perfume que ele vendia, suplantou a minha poesia. Nenhum dos dois jovens subestimou um ao outro. Porém, no fim dos dois dias de venda, já não havia dúvida, Marta e Joaquim estavam embriagados no aroma do Chanel.


O poeta Ortegal não culpou o rival, apenas reconheceu que deveria ter casado com a moça no começo do namoro, pois depois de quinze dias, Joaquim e Marta já estavam na igreja. Um mês depois de casados já moravam na cidade grande. Bertoldo, um boêmio cachacista do povoado, encontrou Ortegal e perguntou: Homem, cadê a bela Marta? Ortegal, de pronto, respondeu: ela se enamorou de outro rapaz, depois que o ciclone atingiu nossos destinos, nenhum de nós pensou voltar atras, foi orgulho e muito desatino. Eu até bebi champagne no seu noivado e traguei minha mágoa no peito sem rancor, fui o primeiro a chegar à igreja e, amargurado, assisti o orgulho matar o meu sonho de amor. Mas sou um poeta, quem é poeta nunca perde a esperança, ela vai voltar e vai atirar-se nos meus braços chorando e dizendo: sou eu, estou com fome de amor e vim te procurar, estou cansada de outra boca beijar pensando em ti. O poeta pensou assim, mas dizem que Marta e Joaquim viveram juntos até que a vida dissesse fim. Cadê o poeta? Dizem que ele se casou com a lua, como sempre fazem os poetas.



4 comentários:

  1. A destreza do amor
    ... Em sua velocidade e flexibilidade o torna ciente do que quer, ou do erro que vai cometer. Mas quem liga?! Já sabemos o resultado bom e mal do amor. Só que a vantagem dele está em testar o resultado com nós mesmos

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    1. Muitas vezes o teste do amor é perigoso, pois não conhecemos o coração dos outros.

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    2. É perigoso... Mas todos testam

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  2. Quiçá se a amada do poeta não o deixasse, não amaria tanto e sequer poeta seria. Elas passam, eles passam lentamente, fica a poesia e, depois, só a lua!

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