domingo, 28 de novembro de 2021

COLUNA DO DR. ERIVELTON LAGO

 


HENRIQUE- AUDACIOSO, OUSADO E SEDUTOR

No início dos anos 80, quando eu morava nas imediações do Canto da Fabril, São Luís, MA, eu conheci uma pessoa cujo nome era Carlos Henrique Mafra, nos tornamos grandes amigos, não sei por onde ele anda hoje, mas foi o cara mais audacioso e sedutor que já conheci. Ele era extremamente corajoso. Ele era também um verdadeiro bom vivant e até mentiroso, porém eu tinha o maior prazer em andar com ele nos nossos dias e noites de farra no bar ponto de fuga, Praça Deodoro e Sá Viana. Onde o Mafra estava as coisas aconteciam. Em geral, somos tímidos. Queremos evitar tensões, conflitos e agradar a todo mundo. O Henrique não era assim, tensão era o seu forte. Às vezes ficamos assustados com as consequências das nossas atitudes, ficamos preocupados com o que os outros vão pensar de nós. Mas o Henrique gostava de despertar hostilidade para depois lidar com ela. Embora possamos disfarçar nossa timidez como uma preocupação com os outros, um desejo de não ofender ou magoá-los, na verdade é o contrário, estamos preocupados realmente é com nós mesmos, ou com a imagem que os outros fazem de nós. Mas o Henrique Mafra era diferente, a sua preocupação era ganhar a vida sem fazer muito esforço, sem furtar ou roubar, mas fazer com que as pessoas dessem a ele o que queria e ainda agradecê-lo. O Henrique era pai de santo, professor, promotor de justiça, médico e delegado da polícia federal. Toda vez que saíamos ele era uma autoridade ou profissional diferente. Ele gostava de usar roupas brancas ou azul royal. Ele era sedutor e atrevido. Corajoso e bandido. Porém, ele não era um bandido qualquer, era um cara intrépido e autoconfiante, um “bandido” muito legal. A pessoa corajosa tem moral forte e firmeza de espírito. A coragem é direcionada para fora, e costuma fazer as pessoas se sentirem mais à vontade, visto que é menos reservada e menos reprimida. Todo homem corajoso é admirado. O Henrique Mafra era sedutor e todo grande sedutor vence pelo atrevimento. A audácia do Henrique não se revelava apenas na ousadia de conquistar as mulheres, mas na ousadia de conquistar qualquer pessoa. quando o Henrique desejava uma mulher ele lançava para ela audaciosas palavras de elogio inigualável, ele tinha a capacidade de se entregar a ela totalmente e fazê-la acreditar que faria qualquer coisa por ela, até arriscar a própria vida o que de fato fez algumas vezes. Um dia pegamos um taxi para o Sá Viana, no caminho o carro pifou, acho que algo relacionado com a bateria. Chuviscava. Todo mundo desceu do carro, mas a Marta Flor, sua namorada, ele não permitiu que ela descesse do veículo. Empurramos o carro com ela dentro. Um dia de carnaval na Madre Deus, um indivíduo, numa crise de ciúmes, puxou um revólver para atirar numa moça que conversava com ele. Vou te meter bala, sua cachorra! Disse o ciumento. O Henrique abriu os braços na frente da jovem e disse em voz alta: “oh, meu amigo, atire em mim, pois sou eu o culpado por ter puxado uma prosa com a sua namorada, mas mesmo à beira da morte, peço perdão”. O ciumento baixou a arma e se retirou do salão. A mulher a quem o Henrique dedicava as suas atenções compreendia que ele não estava escondendo nada. Isto era infinitamente mais enaltecedor do que elogios. Em nenhum momento durante a sedução ele mostrava hesitação ou dúvida, simplesmente porque ele nunca sentiu isso. O Henrique era descarado, não sentia constrangimento por seus atos censuráveis, era desfaçado, sem-vergonha, imprudente, mas no final de um dia de farra a conta era dele, ninguém punha a mão no bolso para pagar nada. Porém, quando estava liso, não queria sair. Dizia: estou liso hoje, podem ir, mas nessa hora todos diziam: tu tens que ir, senão o passeio não vai prestar, ele simplesmente dizia: então vamos, mas raramente Henrique estava liso. Na verdade, parte do encanto de estar sendo seduzido é que nos faz sentir envolvidos, temporariamente fora de nós mesmos e das dúvidas habituais que permeiam as nossas vidas. No momento em que o sedutor hesita, quebra-se o encanto, porque nos tornamos conscientes do processo, do seu esforço deliberado para nos seduzir, pois às vezes caímos conscientes no mundo da ilusão porque é um mundo adorável. O sedutor é corajoso e mantém viva a ilusão no próprio coração e no coração dos outros. A coragem não induz à deselegância ou embaraço, a coragem liberta os medrosos. O Henrique era corajoso. Todo mundo admira o corajoso, todos nós preferimos ficar perto do corajoso porque a sua autoconfiança nos contagia e nos arranca do nosso próprio reino de introspecção e reflexões. O Henrique era assim e são raros os que nascem ousados como ele. Acho que toda pessoa deveria praticar e desenvolver a sua ousadia. Sempre aparecerá uma ocasião para usá-la. O Mafra era professor por vocação, mas não sei onde ele se formou. Era delegado de polícia, mas nunca prendeu ninguém. Era curandeiro, mas nunca curou ninguém. Era promotor de justiça, mas nunca acusou uma pessoa. Era médico, mas nunca medicou. Mas por que ele era amado por todos e tinha uma vida livre? Era ousado. O melhor lugar para começar quase sempre é o delicado mundo das negociações, particularmente aquelas discussões em que lhe pedem para fixar o seu próprio preço. Quantas vezes nos desvalorizamos pedindo muito pouco? O Mafra vivia como queria, exerceu várias profissões apenas para testar a capacidade do atrevimento, da audácia, do cinismo, do desaforamento, do descaramento e da petulância, mas extremamente conservador, era honesto. Moral da história: Todos nós temos fraquezas e nossos esforços nunca são perfeitos. Mas agir com audácia tem a magia de ocultar as nossas deficiências. Não seja como o Henrique Mafra, mas seja audacioso.



6 comentários:

  1. Excelente!!!

    Ousadia é uma característica necessária a todos os Criminalistas!!!

    Obs: quero conhecer o cantor Zé Lopes, em Bacabal, tão bem falado pelo Mestre Erivelton Lago.

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  2. Dra Raquel, o Zé Lopes é um artista bacabalense. Ele é o pensador do Blog e certamente vc terá a oportunidade de ouvi-lo numa dessas suas vinda ao Maranhão. Será um prazer levar vc para comer um suribim às margens do Mearim....

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  3. "Quantas vezes nos desvalorizamos, pedindo pouco",audácia, outra palavra forte, adorei o texto, muito reflexivo.

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  4. As pessoas nos avaliam com base no valor que damos a nós mesmos. A audácia nos tira do conforto para nos lançarmos em busca das coisas boas que o mundo pode nos oferecer.

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  5. Mafra é a personificação do que as pessoas desejam dos outros.
    Indiretamente ele se importava sim em agradar as pessoas.
    Ele era o ator da vida real. Várias faces, personalidades. Mas vsa ex... Que o conhecia, apenas sabia de uma delas. Ou do conjunto das delas.
    O Mafra é o espelho do homem frio... Não diria psicopata, mas beira ao distúrbio.
    Ator de ruas com suas diversas formas, falava o que as pessoas desejam ouvir e era que todos almejavam ter por perto, dependendo do público que ele se encontrava.

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  6. O Mafra vivia um dia a cada dia. Todo dia era um bom dia, mas se não fosse ele fazia o dia ficar bom...se recebesse o pagamento de professor na 2ª feira, ele dizia: vamos no Sá Viana, agora? BL ninguém rejeita, então fazer o que? Íamos!!!

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